Enquanto não iniciamos a nova temporada de análises, eu e o pessoal do Café com anime resolvemos analisar alguns filmes, e aqui está o resultado, o Dissidência Pop ficou responsável por publicar nossa conversa sobre Roujin Z, enquanto o É Só Um Desenho, ficou responsável Cleopatra, de Osamu Tesuka, já o Finisgeekis publicou nossa conversa sobre o filme Horus. E o Anime21, sobre Jin Roh. Por isso peço encarecidamente que deem uma conferida nos textos nos respectivos blogs participantes da iniciativa.
Sem mais delongas, deixo vocês com nossa análise de Roujin Z!
Gato de Ulthar
Olá a todos? Como combinado, antes de começarmos uma temporada nova do Café com Anime, até que todas as estreias tenham vindo ao ar, estamos fazendo um especial sobre filmes, e o filme que escolhi foi Roujin Z, um filme de 1991 dirigido por Hiroyuki Kitakubo e escrito por Katsuhiro Otomo, que por sinal é o criador do clássico cyberpunk Akira. Tivemos também a participação de Satoshi Kon na animação deste filme.. O filme possui uma premissa muito interessante, a população de Japão está envelhecendo consideravelmente, e cuidar de pessoas idosas tornou-se caro ao estado. O governo propõe uma solução tecnológica, uma cama eletrônica que possa fornecer o paciente todo o essencial que uma enfermeira de verdade possa vir a oferecer (menos amor e carinho claro). Haruko é uma das tais enfermeiras, assim como o senhor Takazawa é seu paciente mais querido, que foi escolhido como um cobaia para a tal cama eletrônica sofisticada. Sentindo que seu protegido esta sofrendo de falta da amor, do qual uma cama mecânica não pode oferecer, ela tenta salva-lo do que acha ser um martírio para ele. E aí começa uma série de infortúnios e situações cômicas que quem viu o filme bem sabe.
Eu achei o filme muito bem humorado e gostoso de assistir, a abordagem da terceira idade é rara de se ver em animes e mangás, e o filme trabalhou com maestria sobre um sério problema do Japão, além de muitas outras questões. A animação deixou a desejar em alguns pontos, estando longe de ser um Akira da vida, mas mesmo assim ficou bem bacana de se ver. Não vou me estender por aqui, comentem o que vocês acharam desse filme para darmos prosseguimentos à discussão.
Vinicius Marino
Roujin Z é a prova de que plot é overrated. E que grandes mestres conseguem tirar leite de qualquer pedra.
Nunca na minha vida eu imaginaria que uma história sobre uma cama de hospital que embirutece seria cativante. E eis que o filme conseguiu me prender na cadeira (rindo a plenos pulmões) do começo ao fim.
Interessante você ter mencionado o Satoshi Kon. Na medida em que a cama ganha vida e começa a agregar partes de outras máquinas, lembrei imediatamente da parada do filme Paprika. Não duvido que o finado mestre tenha se inspirado nessa sua experiência para aquela criação.
Diego
Então, sobre aquele final… Todo mundo morreu, ou o que? 😛
Bom, de minha parte, eu estaria mentindo se dissesse que o filme me manteve cativado do início ao final, mas acho que a maior parte da culpa é minha mesmo (minha atenção pra filmes é uma coisa complicada). Mas pelo menos da segunda metade pra frente ele me prendeu, e num geral foi uma experiência super gostosa de assistir.
E eu sinto que a cena do início onde apresentam a cama é um ótimo resumo dos temas do filme. Ninguém ali estava realmente preocupado com o idoso, nem perguntaram o que ele queria. Tinham uma preocupação talvez ideológica, no sentido de estarem comprometidos com a causa de ajudar, mas em nenhum momento pararam para ouvir as pessoas que dizem querer ajudar.
Fábio “Mexicano”
É assim que eu gosto do meu cyberpunk, com temas que “clicam” imediatamente, sendo “resolvidos” de forma tecnológica – e dando tudo errado. Ou talvez tenha dado certo? Quero dizer, o desenvolvedor sabia muito bem que estava usando um chip militar, e era exatamente isso o que ele queria testar. Bom, cyberpunk sem conspiração também não é cyberpunk, não é?
Vinicius, sabe que ao longo do filme pensei várias vezes em Paprika também? Claro, a tecnologia é diferente e o uso é mais amplo, mas há muitos paralelos entre as duas histórias. Saber da participação do Satoshi Kon não me surpreendeu. Vejo no MyAnimeList que Hisashi Eguchi foi o character designer tanto de Roujin Z quanto de Perfect Blue, e tudo faz muito mais sentido assim. Ele não trabalhou (ou o MAL não sabe que ele trabalhou) em outros filmes do Kon, mas seu traço foi herdado por quem quer que o tenha seguido.
Sobre o problema de uma população envelhecendo, ele é grave em todo o mundo desenvolvido, e dramático no Japão. Cuidar da saúde dos idosos é só um dos problemas: aqui no nosso próprio Brasil, um dos assuntos na ordem do dia é uma reforma do sistema previdenciário – porque está ficando muito caro, veja só, manter todos esses idosos. No Canadá, não vou postar links aqui porque não consigo verificar a confiabilidade deles, mas há denúncias de que no Canadá, um país com sistema de saúde público, como o Brasil, pacientes mais velhos são deliberadamente deixados para morrer (não recebem o tratamento adequado que poderia salvar-lhes), já que custam mais caro ao sistema. É mentira? Talvez seja. Mas é uma mentira verossímil em um mundo que está cada vez mais velho. Eu que vi a minha avó entrar no hospital e em um pouco mais de um mês receber vários diagnósticos diferentes, ter a transferência para um hospital maior e mais bem equipado ser seguidamente adiada até que ela estava tão mal que foi cancelada, e por fim morrer, certamente ficaria tentado a acreditar se alguém de dentro me dissesse que foram ordenados a deixá-la morrer porque representava apenas um “custo” para o estado.
Roujin Z além de tudo é divertido, é cômico, mesmo tratando de um tema bastante sério. Eu não tenho problema nenhum com isso, o filme não fez pouco caso do problema, muito pelo contrário.
Gato de Ulthar
Eu também não acho que foi um desrespeito com o tema da terceira idade, o toque de humor só ajudou na contextualização da obra.
Outro ponto central da obra foi transmitir a ideia de que uma máquina não é capaz de suprimir as relações humanas, o contato e o carinho que um cuidador pode oferecer. Muitos idosos são enfiados em asilos ou deixados sozinhos, a solidão é um grande problema na terceira idade, e simplesmente enfiar o idoso numa máquina daquelas está longe de ser uma solução. Se pelos conjugassem uma máquina útil com cuidados humanos pessoais, ai poderia ser algo um pouco mais adequado. O que acham?
Fábio “Mexicano”
O sistema atual do anime (um alerta) não é tão diferente disso que você propõe. Combine isso com tecnologia que temos disponível hoje em dia, como sensores cardíacos e outros wearables médicos, ligados em uma rede pessoal ad-hoc conectada ao seu celular ou à rede da sua casa, capaz de alertar família e médicos de emergências, e isso tecnicamente existe. Mas faz mesmo diferença?
Diego
Fora que o filme se torna meio ambíguo nessa questão da máquina não poder prover afeto no momento em que ela “encarna” a esposa falecida do velhinho.
Fábio “Mexicano”
Discordo. Uma máquina é uma máquina, e mesmo sendo “bem intencionada” em momento nenhum Roujin Z a retrata como uma solução ou algo sequer minimamente aceitável ou desejável. Na verdade, bem antes disso, durante a apresentação para a imprensa da máquina o Terada diz que um dos recursos dela é, na falta de pessoas reais com quem o idoso possa se corresponder, criar personas falsas para interagir com ele. E isso é assustador, como todo o resto daquela apresentação.
Esse tipo de dilema, em animes cyberpunk, acho que você vai ver a partir de Ghost in the Shell, não antes.
Gato de Ulthar
E a máquina emular a esposa dele não era um recurso do sistema médico da cama, foi um efeito colateral em virtude da tecnologia militar envolvida.
E o negócio, mesmo que aparentemente bem intencionado, era muito perigoso, basta ver a última cena com o Mecha/Buda destruíndo tudo pela frente.
Vinicius Marino
Sem dúvida. Tudo no enredo a partir da tomada de consciência do apetrecho é um grande golpe de ironia. Uma redução ao absurdo para escancarar quão inumana a ideia da cama de fato é.
O Fábio disse tudo: não estamos muito longes do dilema moral proposto pelo anime. Idosos viraram um empecilho e são despejados em asilos, ou então mantidos vivos a custos exorbitantes para as famílias, com mínima qualidade de vida.
Hoje em dia, há inclusive toda uma corrente da medicina que propõe dar um passo atrás nisso tudo. Reconhecer que a morte e o envelhecimento são partes fundamentais da vida. E que não devem ser evitados se o preço do tratamento for eliminar a dignidade dos indivíduos. Atul Gawande é um dos seus principais defensores: https://www.amazon.com.br/Mortais-Atul-Gawande/dp/853900674X
Fábio “Mexicano”
Como um defensor do trans-humanismo para superar a morte, eu discordo disso por princípio Mas a verdade é que ainda estamos no escuro sobre uma “solução final” para a morte, apesar de estudos em diversos campos diferentes, então todo debate é válido e no final das contas a decisão deve caber a cada indivíduo e sua família.
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Vinicius Marino
Minha simpatia com o trans-humanismo acaba nos planos quixotescos para conquistar a imortalidade (por motivos que prefiro não abordar, pois renderiam um debate inteiro rs). Mas de fato, não é disso que se trata.
Não existe “solução final” da morte, apenas pessoas e famílias que vão à falência e abrem mão da dignidade perseguindo moinhos de vento. E uma série de fatores, do comercialismo da indústria médica à pressão de familiares, que os forçam a tanto.
Esses moinhos são vários: cirurgias que pouco aumentam a sobrevida do paciente, mas o confinam a uma cama. Drogas experimentais caríssimas, que podem esvaziar contas bancárias em questão de meses. Exames desnecessários, pois diagnosticam problemas contra que não existem soluções (e, vamos lá, se você tiver 90+ você com certeza tem uma doença que vai te matar. Saber dela não muda nada).
Ou ainda pressões mais indiretas. Por exemplo, idosos confinados a suas casas, proibidos de trabalhar ou de fazer afazeres domésticos sob a justificativa de que “é perigoso”. Como se viver numa gaiola dourada fosse preferível a morrer independente, fazendo aquilo que gosta.
Já passei por várias situações assim, sobretudo com meu avô, que faleceu em 2016 aos 91 anos. Ele sempre foi um hipocondríaco incorrigível, apavorado por qualquer problema de saúde. Quando chegou na idade em que problemas de saúde são inevitáveis, gastou fortunas com exames, terapias e tratamentos alternativos.
Tenho outro exemplo relacionado ao meu cachorro da infância. Ele contraiu câncer aos 10 anos de idade, e minha família gastou uma pequena fortuna submetendo-o à quimioterapia. Ele faleceu meses depois (tão rápido quanto faleceria sem tratamento), e o processo lhe trouxe um imenso sofrimento na reta final.
Hoje, aprendemos a lição. Meu atual cachorro tem uma mancha na língua que provavelmente evoluirá para um tumor maligno. Nós não faremos nada, deixaremos ele viver feliz enquanto estiver confortável e então o sacrificaremos caso o câncer de fato o debilite.
Diego
Pessoalmente, minha posição é diametralmente oposta à do Vinicius. Eu quero viver, e por consequência não quero morrer. Ponto. Parto do princípio de que algo é preferível ao nada: não me parece provável a existência de vida após a morte, e a perspectiva de simplesmente deixar de existir me incomoda imensamente. Então é, por mim a humanidade deve sim buscar a imortalidade, ou no mínimo o aumento da expectativa de vida
Fábio “Mexicano”
Esse é um assunto muito interessante, e eu adoraria continuar discutindo sobre ele, mas acho que nem é o ponto do filme então não sei se seria adequado. Em todo caso, o Gato é o anfitrião, ele decide
Gato de Ulthar
Eu não sabia que o Diego e o Fábio eram adeptos às teorias trans-humanistas. Nem quero discutir esse tema que é espinhoso, mas vou me dar ao direito de concordar palavra pro palavra com o que o Vinicius disse. E não é por não ter medo da morte, longe disso, eu morro de medo de morrer, mas não acho correto nem viável mexer com a vida humana. Tenho um exemplo de uma tia-avó minha, a senhora e super ativa e tem 85 anos! Aprendeu a tocar gaita com 80 a nos e ainda por cima fez um curso do corpo de bombeiros e já até participou de uma busca por uma criança desaparecida em uma floresta da região. Ninguém segura essa velhinha. Mas claro que a realidade geral não é tão bonita assim, a maioria dos idosos possui uma série de doenças incapacitantes, onde o cuidado para com eles é o mesmo que para uma criança.
Mas mudando um pouco de assunto, sobre o Terada, o chefe do projeto da cama, suas intenções eram boas? Ele era basicamente um político, mas não senti como se ele fosse inerentemente mal, a intenção dele ajudar os idosos parecia verdadeira, mesmo que com uma execução muito ruim. Qual a opinião de vocês sobre esse personagem?
Diego
Nós já mexemos com a vida humana ao longo de toda a nossa história, Gato Só chegamos aos 80 e poucos anos, ao invés de morrer com alguns meses de vida, por conta de uma série de avanços no campo da saúde e do saneamento. Mas tudo bem, avançando 😀
O Terada é uma figura interessante porque ele começa soando muito insincero, o que de certa forma joga com a nossa própria expectativa do empresário engravatado que só pensa em lucros. Mas conforme o filme avança, vamos vendo que ele parece ter genuína preocupação com os velhinhos, e de fato só estava equivocado na solução que buscou.
Fábio “Mexicano”
Sobre os 80 anos, nem tanto, Diego. O que acontece é que antigamente a mortalidade infantil era muito alta e ainda por cima haviam muitas guerras. Mas se você sobrevivesse à infância e vivesse em uma época e região particularmente pacífica, viver até os 70 anos, mesmo entre as classes mais baixas, não era incomum. Mas já superamos esse assunto, né
O Terada com certeza é um político. Políticos precisam parecer que acreditam em tudo o que falam o tempo todo, principalmente quando não acreditam. Por isso (e pela forma como a cama é introduzida) é que a gente é levado a ter essa má vontade com ele. É proposital. Mas, conforme descobrimos depois, tudo o que ele fazia, mesmo as coisas sujas, era porque ele realmente acreditava que aquilo era para um bem maior.
Parte fundamental de ser político é isso. É a chamada ética da responsabilidade, que se opõe a que normalmente consideramos superior ética da convicção. O problema é que existem muitas convicções diferentes, frequentemente incompatíveis, então como conviver em sociedade? Jin-Roh nos dá uma reposta diferente: mate quem pensa diferente. Viva e morra pela sua convicção, não importa os sacrifícios necessários.
Vinicius Marino
Ele é o perfeito showman que acredita demais no seu produto. De certa forma, combina traços do figurão da indústria obcecado pelo lucro e do profissional da saúde que se acha o maioral. Ao ponto, às vezes, de se esquecer até de que seu paciente é um ente sapiente.
Você vê isso muito em ficção médica (e, sendo filho de médicos, devo acrescentar que também na vida real). O cara tem um plano genial para salvar um paciente, reformar um hospital, erradicar uma doença. Só que está tão fissurado na própria missão que não considera o custo humano para isso.
Uma das cenas mais enfática de Roujin Z nesse sentido é uma das primeiras. O filme começa com seu velhinho fazendo xixi na cama. Depois, quando está já acoplado na cama, vemos um tubo se colar à sua região genital.
É algo, sob alguns aspectos , muito mais degradante do que molhar as calças. Uma fralda (e uma enfermeira disposta) dariam conta do recado, mas ele quis pensar mais longe. A detrimento do bem estar do coitado.
Gato de Ulthar
E tem a questão do livre-arbítrio né? Ninguém perguntou se os idosos queriam ou não ser acoplados nas máquinas. Claro que pegaram idosos aparentemente incapazes de dar uma opinião clara sobre o assunto por incapacidade física, mas me pergunto se não se tornaria comum enfiar um idoso plenamente consciente em uma máquina dessas? Imagina o susto do velho ao se ter introduzido todos aqueles cabos e “gadgets”?
Vinicius Marino
A própria questão da incapacidade bate em um dos maiores dilemas da medicina moderna. Nós temos direito de julgar o que
é melhor para pacientes que não conseguem se exprimir? Idosos paralisados, comatosos, delirantes. Até que ponto podemos confiar na opinião de seus responsáveis legais. (que, muitas vezes, podem apenas querer se livrar de um fardo o mais rápido possível)?
Gato de Ulthar
Somado a isto temos o interesse de familiares de se livrar o mais rápido destes fardos, e também há aqueles médicos e hospitais com interesses de prolongar, mesmo que dolorosamente, a sobrevida de muitos idosos só com fins financeiros em mente.
Fábio “Mexicano”
Quanto aos familiares, os há dos dois tipos: os que querem prolongar a vida do paciente, mesmo além de qualquer racionalidade, e os que querem jogar seus idosos em depósitos e esquecer deles lá.
Gato de Ulthar
Vou fazer uma pergunta bem direta agora, vocês consideram Roujin Z como um filme sobre “mecha”?
Diego
Olha, há quem diga que não existe história sobre mecha, mas sim que os mechas são apenas elementos dentro de uma história sobre alguma outra coisa E no extremo oposto há quem considere “mecha” qualquer coisa robótica pilotada por alguém De minha parte: não, não chamaria Roujin Z de “mecha”.
Vinicius Marino
Uma cama para ajudar velhos é a última imagem que eu esperia de um anime mecha. Mas é um robô, então talvez se enquadre no rótulo de alguma forma.
Fábio “Mexicano”
Eu com certeza indicaria Roujin Z para alguém que goste de mechas, isso vale como um sim? Quero dizer, aquilo era parte de um projeto militar afinal de contas, o mecha canônico está logo ali virando a esquina.
Gato de UltharÚltima Quarta-feira às 23:19
Fiz a pergunta por ver alguns comentários que classificam o anime como um exemplo criativa de reinventar o uso de mecha. Eu particularmente não gosto destas definições, mas como temos até luta de robôs, não brigo com quem vê desta forma.
Fábio “Mexicano”
É um mixed robot (elementos de super e de real) antes de Evangelion, olha só
Gato de Ulthar
E falando de nossas impressões sobre o filme, teve alguma cena ou momento que lhes chamou mais a atenção?
Vinicius Marino
O ponto alto para mim, sem sombra de dúvidas, foram os velhinhos hackers do asilo.
Eles não são apenas personagens hilárias, mas incrivelmente criativas. Nós estamos acostumados a ver idosos como pobres coitados afastados da ação. Ou então super-heróis inverossímeis, que de velhos só têm os cabelos brancos. Roujin Z nos trouxe velhos ativos, protagonistas, capaz de “competir” com jovens face a face – e sair ganhando.
É o tipo de retrato que enfatiza perfeitamente a mensagem do filme. Velhos ainda estão aqui. E ainda podem ser relevantes.
Gato de Ulthar
E quanto aos velhinhos hackers, isso é muito interessante, pois mesmo que esse tipo de “profissional” já não seja mais tão recente, na época do filme era uma coisa de jovens. Interessante pensar que esse pessoal envelheceu, se ofilme realmente passou em um futuro próximo.
Diego
Pra mim o momento que mais chamou a atenção foi o já bastante discutido aqui momento em que temos a primeira demonstração de como funciona aquela cama, uma cena que encapsula muito bem uma das críticas do anime.
Fábio “Mexicano”
Eu tenho que falar uma coisa depois do Vinicius e o Diego terem falado as duas melhores? Eu deveria ter sido mais rápido. Vou só propor então uma imagem mental: imaginem se o velho preso à cama experimental fosse ele próprio um hacker.
Gato de Ulthar
Seria interessante, imagina se o usuário da cama tivesse controle total sobre as habilidades dela? Teria um grande poder na mão.
Vinicius Marino
Aí ele seria para todos os fins um ciborgue. Quando não um super-humano.
Gato de Ulthar
Roujin Z pode não ser o filme mais famoso do mundo, nem a obra de Otomo mais relevante, mas vejo que ela representa a genialidade de um autor muio competente no campo da ficção científica. E parando para pensar, Roujin Z pode possuir algumas similaridades com Akira? Principalmente no que concerne as animações das assimilações da cama quando absorve diversos materiais, isso me lembrou as transformações de Tetsuo. Claro que a animação de Roujin Z é inferior a de Akira, mas penso ser uma comparação relevante. O que acham?
Fábio “Mexicano”
Não vi quase nada semelhante entre os dois, de verdade. O Tetsuo possui movimentos (compreensivelmente) mais orgânicos, enquanto a Roujin Z causa o estrago que causa, em parte, porque é uma máquina desajeitada. Se formos falar em semelhanças, Roujin Z é praticamente um protótipo de Paprika, de Satoshi Kon, tanto na animação quanto no enredo. Acho que já mencionamos isso aqui, né?
Diego
Eu realmente não sou a melhor pessoa pra traçar comparações do tipo: faz um bom tempo que vi Akira, e quando vi eu não gostei
Vinicius Marino
Eles têm uma certa semelhança na maneira como seus protagonistas se desumanizam ao longo do clímax, em conflito (de uma maneira ou de outra) contra a sociedade.
E, claro, uma certa meditação sobre como a tecnologia e o futuro podem agravar esses conflitos.
Se nada mais, eu consigo assistir a ambos e perceber que são do mesmo autor.
Gato de Ulthar
E já para irmos encerrando nosso bate-papo, como vocês atribuem a importância deste filme hoje? O seu tema ainda é relevante e se mostra atual? Ou é apenas uma obra relegada ao esquecimento como tantas outras ficções cientificas?
Diego
Eu diria que na prática ele foi sim relegado ao esquecimento. Ou pelo menos não vejo quase ninguém falando dele. Mas em termos de temática eu diria que ele segue tão atual e importante quanto quando primeiro saiu.
Fábio “Mexicano”
É um tema mais relevante hoje do que no passado. Chega a ser criminoso que o envelhecimento da população já fosse um problema digno desse tipo de atenção no Japão de quase 30 anos atrás e que pouca coisa substantiva tenha mudado a respeito.
Vinicius Marino
De fato, eu nunca tinha ouvido falar de Roujin Z antes de você nos propor esse café, Gato. Mas, de fato, é uma temática muito mais relevante hoje do que no passado. E continuará sendo, pelo jeito, posto que não há solução fácil para o envelhecimento da população japonesa.
Paradoxalmente, é também um anime que “envelhece” mal por conta de seu retrato da ciência. Algumas das suas implicações (como o fato de que cada cama seria movida por um reator nuclear) são bastante ridículas. Uma abordagem um pouco mais mística ou um pouco mais nonsense talvez passasse outra impressão. A mim, hoje, porém, sinto que ele caiu num “vale da estranheza” do sci fi, nem tão démodé, nem tão atemporal.
Pode ser que isso mude no futuro. Mas, até aí, sinto que o futuro terá seus próprios animes sobre esse problema (assim como o presente também o tem).
Fábio “Mexicano”
Na época que ele foi feito acredito que a ideia de reatores nucleares portáteis alimentando todo tipo de parafernália já era coisa do passado.
Vinicius Marino
Imagino que a ideia de que você consegue sintetizar a voz de uma pessoa só pela foto também.
Fábio “Mexicano”
Isso eu consigo imaginar gente ainda hoje acreditando que seja possível. Mas como ficção científica mainstream … não sei. Acho que esses seriados policiais seriam capazes de fazer isso, hein?
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Gato de Ulthar
Encerrando e deixando minha opinião, é um fato que o filme não é nem um pouco famoso, mas concordo com o que disseram, que o tema continua sendo importantíssimo e atualíssimo, parece que não mudou nada, até piorou, a situação dos idosos no mundo, o Brasil é um bom exemplo disso. Por isso, além de todo o espetáculo estético, Roujin Z serve como ponto de partida da reflexão quanto aos seus temas abordados.
Agradeço a todos do Café por essa oportunidade de discutirmos sobre filmes tão interessantes, e até a próxima!