Legend of Black Heaven. O rock salvará o espaço!

O Dissidência Pop volta à ativa neste começo de 2017 comemorando a centésima postagem do blog, e para tanto falarei de um anime bastante interessante, perfeito para os apreciadores da música, especialmente o bom e velho Rock, o anime é Kachou Ouji: Hard Rock Save the Space, conhecido também como The Legend of Black Heaven. Como o nome permite sugerir, trata-se de um épico de ficção científica onde o elemento que salvará o planeta Terra é o Rock! Pode parecer uma comédia, e sim, é uma comédia, embora não nos padrões que estamos acostumados.

Primeiramente, começamos com os dados técnicos. Kachou Ouji: Hard Rock Save the Space é uma anime para televisão composto por 13 episódios, que foi originalmente ao ar entre 8 de julho 1999 a 7 de outubro de 1999. O anime foi produzido pelos estúdios AIC e APPP. O anime ganhou ainda um mangá one-shot, Kachou Ouji Gaiden, com história e arte por Hiroshi Tamaru. Legend of Black Heaven, como prefiro chamar, foi dirigido por Yasuhito Kikuchi, experiente diretor, que dirigiu uma infinidade de animes, como Saint Seya, Golden Boy e IS:Infinite Stratos.

Legend of Black Heaven, é um anime de 13 episódios sobre a saga de Oji Tanaka, um homem aparentemente comum na meia-idade, vivendo uma existência monótona, trabalhando em uma companhia como um típico “salary-man”, figura típica do Japão que pode ser definida como executivos de baixo escalão numa empresa. Ocorre que nem sempre a vida foi tão tediosa para Oji Tanaka. 15 anos atrás ele era conhecido como Gabriel, o guitarrista principal da banda de hard rock Black Heaven, que fez muito sucesso em sua pequena e meteórica existência.

Já deu para perceber a situação, Oji vive frustrado ao ter uma vida de bosta enquanto lembra de seu passado glorioso. E ainda por cima, Oji tem que aguentar uma esposa que tenta a todo custo apagar qualquer boa lembrança do passado de Oji, como jogando fora sua guitarra Gibson Flying V no lixo, forçando-o a levar uma vida corporativa. Tudo muda com a repentina aparição de uma mulher enigmática, Layla Yuki, que devolve a guitarra para Oji e o relembra de suas grandes habilidades com o instrumento, convidando-o para tocá-la. Inicialmente Oji pensa apenas que está tocando em uma estranha casa de shows, mas a realidade é mais “cósmica” por assim dizer.

Oji toca sua guitarra para salvar a galáxia. De uma maneira surreal, o som de sua guitarra é a única força capaz de ativar uma super arma existente no espaço capaz de eliminar a frota alienígena que pretende dominar aquele setor da galáxia. Então, cada vez que ele é chamado por Layla Yuki para tocar, que inclusive começa a trabalhar na mesma companhia que Oji para ficar próximo dele, é quando um ataque está ocorrendo. Ao longo do anime ele descobre a verdade e os meandros que permeiam o poder de sua música.

Enquanto isso sua vida sofre uma mudança drástica, tanto no trabalho como em casa, pois Oji aparenta estar sofrendo da crise da meia-idade, tentando retomar seus antigos gostos. Em casa, sua esposa Yoshiko tenta a todo custo desestimular isso, até mesmo desconfia que ele está a traindo com Layla Yuki, apenas seu filho aprovou sua mudança. Dentro deste contexto se desenvolve Legend of Back Heaven. Oji descobre aos poucos os efeitos de sua nova condição como salvador da galáxia na sua família, no seu emprego e nos seus antigos colegas de banda.

Legend of Black Heaven é uma comédia, mas nem tanto, seria melhor definido como uma comédia-dramática. Não espere explosões de risos e situações apelativas. A vida de Oji não é nada engraçada, é triste, muito triste. Sua vida não possui sentido enquanto é apenas uma assalariado típico como tantos outros que existem. Mas como a sociedade impõe, Oji teve que “amadurecer”, levando uma vida “séria” com o limitado objetivo de crescer na companhia. Isso se deu principalmente pela gravidez de sua esposa, uma antiga groupie da Black Heaven, e justamente ela foi a que mais rápido esqueceu o passado do rock e mergulhou na vida “decente”, levando Oji junto.

Logo no primeiro episódio fica evidente a péssima qualidade da vida de Oji, já que realiza as tarefas diárias de forma lenta e desmotivada, tal como um zumbi. Por trabalhar o dia inteiro nem ao menos consegue ver o filho e a esposa com frequência enquanto estão acordados. E nestes poucos períodos só o que observa é o descaso de sua esposa e filho com seu passado glorioso, estragando seus discos, jogando fora suas lembranças e coisas do gênero. A vida particular de Oji é um dos pontos principais do anime, enquanto lida com uma vida profissional e um casamento em frangalhos.

Toda essa história de invasão espacial e salvador da galáxia, é uma grande metáfora sobre todos aqueles que sentem saudades dos velhos tempos de juventude, daqueles que abandonam os seus sonhos para viver uma vida estável. Para Oji isso é ainda pior, já que ele experimentou a glória e a deixou de lado, o gosto daquela vida nunca o abandonaria. Oji é um grande saudosista, suas lembranças e alguns pertences é tudo o que resta, em especial seus discos e sua guitarra Flying V, não esquecendo de seu ídolo Michael Schenker, famoso guitarrista que tocou em bandas como Scorpions e UFO.

Quando surgiu a possibilidade de tocar sua guitarra novamente foi praticamente o único prazer de Oji, Seu ânimo e vontade de viver foram renovados, até mesmo a relação problemática com sua esposa sofreu algumas melhorias, quando ela percebeu que a resposta não estava em destruir os sonhos de seu marido, mas incentivá-lo a ser feliz, já que pelo contrário o seu casamento estava à beira da destruição. Seu rendimento no trabalho também melhorou bem como sua relação com  seu filho Gen, fanático por super sentais.

Mesmo assim, a vida de Oji durante o decurso do anime é marcada por altos e baixos, entre momentos de depressão e euforia. Contudo, sem sombra de dúvidas, ter em suas mãos a salvação do Universo é algo muito motivador, já que sua música é a “fonte do som”, com seu feeling capaz de ativar um dispositivo destruidor com a única frequência do universo capaz disto. Interessante como surgiu desde sempre uma certa atração fatal pela bela Yuki, não somente pelos seus atributos pessoais, mas por ser a única  pessoa que incentivou seu sonho de poder voltar a tocar.

Falando um pouco dos personagens de Legend of Black Heaven como um todo, Oji é um protagonista eficiente e divertidíssimo por si mesmo. O mesmo ocorre com os outros personagens, os quais é possível simpatizar ao longo dos episódios como a imponente Layla Yuki e os outros membros da banda Black Heaven. Um destaque que não pode ser esquecido de ser mencionado é o trio composto pelas três belas: Kotoko, Eriko e Rinko, três ajudantes das forças espaciais juntamente infiltradas com Layla Yuki, mas diferentemente de Layla, elas são muito destrambelhadas e não conseguem entender a cultura humana, frequentemente confundindo significados de palavras e expressões, protagonizando cenas hilárias.

Pode ser argumentado que o Legend of Black heaven deixa o humor de lado ao focar nos momentos sérios. Entretanto, mesmo nos momentos mais sisudos, consegue ser descontraído, com alguma piada ou ação irreverente, principalmente as protagonizadas pelo trio Kotoko, Eriko e Rinko. Oji é um protagonista fenomenal, ele próprio é engraçado por natureza, seja quando está todo descabelado, como sempre ocorre, ou quando tem alguns arroubos enquanto relembra os velhos tempos de sucesso. Os diálogos de Legend of Black Heaven nem sempre são o que parecem se, estando permeados de piadas ocultas sobre a música e programas de TV por exemplo.

Mesmo sendo um anime curto, Legend of Black Heaven possui muitos momentos que deixam o andamento da série lento e desajeitado, deixando a trama monótona. Pode ser complicado ver toda a série de uma vez por esse motivo, já que a história demora a andar. O enredo por si só é bem simples e não tem muitas reviravoltas, é somente dividido em dois momentos, a conturbada vida pessoas de Oji e a parte espacial, na qual ele é o salvador do mundo. Apenas nos últimos episódios as coisas começam a andar e aparece mais detalhes dos vilões, com as suas últimas cartadas na guerra espacial. O anime pode ser considerado bom, mas nada extraordinário ou empolgante demais.

E quanto ao final do anime? Infelizmente ele é fraco. Claro, seguiu a conclusão lógica do enredo, com a batalha final com o inimigo etc. Mas, a conclusão deixou a desejar em vários aspectos. Neste parágrafo e no próximo haverão spoilers, se não quiserem ler pulem para os próximos. Eu, como apreciador da série, esperava uma síntese na qual haveria a derrota do inimigo e uma mudança para melhor da vida de Oji, mas não! Ele volta a ser o funcionário de sempre, embora aparentasse estar mais feliz e realizado depois da reunião da Black Heaven e a destruição da ameaça alienígena.

E outra coisa, Layla Yuki foi uma boa personagem, mas havia se tornado desnecessária no epílogo, a cena do beijo em Oji e a sua despedida foi ótima. Ambos sabiam que o relacionamento não iria para a frente e que era o fruto de uma empolgação momentânea. Oji não queria destruir sua família largando sua esposa, mas o fato de Layla no finalzinho ter voltado para a Terra para continuar ao lado de Oji foi péssima, insinuando que no final das contas o casamento de Oji iria por água abaixo, e todo o trabalho de mudança e aceitação foi inútil. Alguns poderão gostar desse fim, eu não. Tirando isso, o último episódio foi lindo, com os remanescentes da banda dando o máximo para salvar o mundo, mostrando que mesmo levando uma vida “séria” é possível tirar um tempo para se divertir pra valer.

Legend of Black Heaven está profundamente relacionado com a música, isso desde a ótima abertura, “Cautionary Warning”, composta e executado por John Sykes, guitarrista famoso que atuou em bandas como Whitesnake e Thin Lizzy. A letra de Cautionary Warning tem tudo a ver com o anime, com sua letra com menções a “space invaders”. Justamente esta música é tema principal que é tocado pelo protagonista ao longo do anime. Neste aspecto a criatividade deixou um pouco desejar, fora essa Oji apenas tocou outra única música.

A trilha sonora como um todo é muito boa, como esperado de um anime sobre música. Outro ponto interessante que envolve música é a questão dos nomes dos episódios, cada um recebeu o nome de uma música que fazia referência ao tema abordado no episódio. Por exemplo, o primeiro episódio se chama Stairway to Heaven, magna opus da banda Led Zepellin, que se encaixa com a “subida” de Oji ao espaço para salvar a Terra. Outro bom exemplo é o último episódio, o qual se chama The End, música da banda The Doors, esse nome nem precisa explicar né? O anime ainda reúne episódios com nomes de músicas de bandas como The Rolling Stones, UFO, Deep Purple, Bad Religion, Aerosmith entre outros.

Quanto aos aspectos gráficos, a animação é bem fraca, o que é compensado por um design de personagens interessante e descontraído. As cenas de batalhas espaciais são sofríveis, parece que usaram sempre os mesmo frames, as naves dando tiros aleatórios de lasers e os inimigos que parecem planetinhas sendo explodidos pelo poder da música de Oji. O uso de elementos em 3D também é bem precário, apenas nas naves e olhe lá, o que é bom por não ser abundante. Tirando esses problemas de animação o que sobra é bom, as cenas da banda em ação são empolgantes. A abertura é bem bacana, com cenas estilizadas de bandas e elementos do hard rock.

Legend of Black Heaven não é o único e nem o mais famoso animes sobre música. Em um universo de obras como K-on!, Beck, Nana e Detroit Metal City, Legend of Black Heaven é praticamente desconhecida. Mesmo assim, merece atenção pelo foco da trama, que envolve comédia e ficção científica, o que torna o anime único, fugindo da seriedade típica deste tipo de anime. Legend of Black Heaven está longe se ser uma obra perfeita, possui muitas falhas que podem tornar a percepção geral do anime não tão boa, mas vale a pena conferir pelo belo trabalho musical, com o bom e velho “Rock and Roll”.

Segue outras imagens bacanas do anime:

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