O que você faria caso acordasse em um planeta totalmente diferente da Terra, sem lembrar direito do que aconteceu após ser abduzido por alienígenas que chegaram do nada? Estranheza e medo são boas opções, mas no fim a necessidade de sobreviver é o que acaba prevalecendo, e o que dizer se a única outra pessoa que há nesse planeta é alguém totalmente desconhecido, será que uma aproximação é possível além da mera necessidade de sobreviverem juntos, bem como os sentimentos nesse contexto podem ser considerados totalmente autênticos? Essas são algumas perguntas que podemos fazer após ler Canaria-tachi no Fune.
Esse é um dos primeiros mangás serializados da autora Misaki Takamatsu, ela já publicou alguns mangás shounen ai antes de Canaria-tachi no Fune, mas esse é sem dúvidas sua obra de maior relevância. Canaria foi publicado de junho a novembro de 2015 na revista Afternoon, a mesma de sucessos como Blame e Vinland Saga, contando com 6 capítulos e um único volume, se tratando, pois, de um one-shot. Mas será que Canari-tachi no Fune possui mais atrativos do que uma capa chamativa? Ressalto que nos próximos parágrafos um ou outro spoiler pode dar as caras.
Se podemos dar uma sinopse para esse mangá seria a seguinte: Yuri é uma menina normal e estudante ginasial, ela adora sair com as amigas e possui muitos sonhos e preocupações, nada fora do normal para uma garota adolescente como tantas outras. Um dia ela acorda em uma estranha floresta onde nunca esteve, juntamente com um homem mais velho que ela nunca tinha visto, chamado Chihiro, que por sinal é um farmacêutico. Ambos ficam desnorteados pela situação inusitada ocorrido, e aparentemente não lembram direito do que aconteceu.
Os dois passam a explorar juntos o lugar, que consiste, além da floresta, de uma estranha estrutura que parece uma espécie de residência alienígena com os mais diversos cômodos e com mecanismos quase sempre incompreensíveis para os seres humanos. Os dois passam continuamente a aprender mais sobre o estranho lugar e descobrem mediante uma mistura de lembranças e achados no local, que foram subitamente abduzidos por alienígenas. O choque é grande e eles não sabem o que fazer, mas fazem o máximo para se virar, descobrem frutas, acomodações e outras coisas que fazem a vida possível.
Mas nem tudo se mantém agradável nesse cenário idílico, a realidade é bem mais dura do que parece. Eles entram em contato com uma inteligência alienígena que os alerta que seus corpos foram modificados e que é impossível viverem na Terra. Ambos partem para buscar outros sobreviventes, enquanto lidam com alienígenas, ilusões e o mais perigoso, eles mesmos, tudo isso enquanto investigam mais o mundo ao seu redor. e buscam por respostas.
O que faz Canaria-tachi no Fune verdadeiramente interessante é o relacionamento entre Yuri e Chihiro, tanto pelo fato de que são duas pessoas de sexo opostos em um ambiente hostil totalmente inabitado, o que acaba fazendo que Yuri veja em Chihiro o seu único contato com a realidade que abandonou, um último vislumbre de sanidade em uma realidade totalmente maluca. Então não é difícil de imaginar que ela passe a nutrir os mais diversos sentimentos pelo rapaz, inclusive românticos.
Enquanto isso Chihiro se mostra quase sempre frio e cínico, fazendo os comentários mais mordazes nas piores horas, por isso seu relacionamento com a Yuri demora a ser revestido de confiança, mas como são os únicos em um ambiente estranho, essa aproximação se torna inevitável. Mas daí que o mangá nos surpreende com um plot twist bastante criativo, realmente nem sempre se é o que parece, e a verdade pode ser bastante difícil de engolir. Não vou contar o que é, pois para isso vocês devem ler o mangá.
O final deixa um gosto agridoce, já que termina de forma que logicamente é considerada satisfatória, mas que dá uma sensação de incompletude, o que é ajudado pelo ritmo veloz da narrativa. Penso que se talvez a autora pudesse ter dedicado mais tempo ao mangá, com uns 2 ou 3 volumes seria um tempo ideal para digerir melhor Canaria-tachi no Fune. No mais, é um exercício criativo sobre uma aventura psicológica em um mundo alienígena.
Falando em mundo alienígena, a autora é sem sombra de dúvidas extremamente criativa, o mundo alienígena é verdejante e cheio das criaturas e ambientes dos mais improváveis, e mesmo assim tudo tenta se assemelhar com coisas e ambientes existentes no planeta Terra, mas de uma forma claramente alienígena. O traço Misaki Takamatsu combina perfeitamente com a temática alienígena de Canaria-tachi no Fune.
E falando dos alienígenas, caso você se aventure na leitura de Canaria-tachi no Fune, verá que essa obra mostra um experimento bastante criativo, mostrando que nem sempre os objetivos de uma invasão alienígena fazem sentido, tudo pode ser o mais banal e destituído de propósito. Quem sabe que não podemos ser invadidos apenas por alienígenas que estavam entediados e queriam brincar com os seres humanas como se fossem bichinhos de estimação? Ou como um daqueles formigueiros de brinquedo?
Canaria-tachi no Fune brinca com essa temática, pena que a execução deixou a desejar, mas mesmo assim é um mangá interessante e com um grande potencial, ainda mais para uma autora quase que começando na carreira. Eu poderia definir Canaria-tachi no Fune como um diamante a ser lapidado. No mais, penso que valha a leitura, ainda mais por ser um mangá bem curtinho, com apenas um volume, e com um bela arte. Fica a dica então!